A marca de roupas carioca, que teve seus produtos exibidos durante a conferência, coleciona polêmicas
A Farm foi escolhida para representar o Brasil durante a Cúpula do G20, realizada no Rio de Janeiro. Conhecida por seu estilo tropical, a empresa assinou o design das garrafas de água térmicas utilizadas pelos líderes globais no evento e distribuiu kits contendo itens como chinelos, camisas, braceletes indígenas, leques e chocolates artesanais.
Apesar do prestígio, o passado da empresa é marcado por episódios questionáveis em relação a posicionamentos de marca. A escolha da Farm como representante brasileira no evento trouxe à tona algumas dessas polêmicas.
O racismo velado em campanhas de marketing da Farm
A Farm já foi diversas vezes acusada de desenvolver ações publicitárias que reproduziam concepções racistas com a cultura brasileira. A primeira delas aconteceu em 2014. Na ocasião, a empresa foi criticada por usar uma modelo branca para representar Iemanjá, orixá de origem africana, levando artistas como o rapper Emicida a denunciarem a apropriação cultural. A resposta da empresa buscou minimizar o impacto negativo da campanha, afirmando que a escolha era “apenas uma fantasia”, gerando mais controvérsia.
Em 2017, outro caso de racismo em uma de suas campanhas. A estampa escolhida para o lançamento da coleção “Ruas do Mar” exibia pessoas negras retratadas como escravas. Após a repercussão negativa, a marca retirou os produtos de circulação e emitiu um pedido de desculpas.
A última, e mais grave, das polêmicas envolvendo questões raciais aconteceu em 2022. Kathlen Romeu, funcionária da Farm e grávida de 14 semanas, foi assassinada durante uma operação policial na Zona Norte do Rio de Janeiro. A Farm então, realizou uma campanha de marketing que destinava parte de seus lucros para a família de Kathlen. Muitas pessoas acusaram a marca de espetacularização da tragédia, uma prática muito racista. Após o ocorrido, a Farm pediu desculpas e decidiu reverter 100% do valor e substituir seu diretor de marketing.
Outras polêmicas que a Farm esteve envolvida
Além das questões raciais, a Farm sofreu outros tipos de denúncias de seus clientes. Em 2016, mãe e filha relataram discriminação em uma loja da marca, onde funcionárias riram de seus corpos e não ofereceram atendimento. A Farm pediu desculpas e utilizou o caso como exemplo para treinamento interno. Apenas em 2020, a marca incluiu tamanhos GG em sua linha de roupas, resultado de parcerias com influenciadoras plus size.
Em 2014 mais uma polêmica. Dessa vez, a marca de roupas enfrentou críticas após um cliente relatar ter sido hostilizado por funcionárias ao tentar comprar uma peça de roupa feminina. Em uma publicação do Facebook, os clientes contaram que as funcionárias da loja ficaram zombando das opções de roupas escolhidas por ele. A empresa então se desculpou e demitiu as envolvidas.
Acusações de plágio da Farm
Além dessas questões, a Farm também foi alvo de acusações de plágio em suas coleções de roupa. Em 2018, a designer britânica Katie Jacobs acusou a marca de copiar seus tricôs ultra coloridos. A empresa reconheceu o plágio no caso de Jacobs e prometeu ressarcimento de todas as peças vendidas da coleção.
Já em 2020, a estilista carioca Ligia Parreira afirmou que a Farm replicou designs inspirados em saquinhos de pipoca. Nesse caso, a empresa negou as acusações, mas o histórico não é bom.
O desafio de reconciliar prestígio e inclusão
O caso da Farm no G20 reflete a complexidade da gestão de marca frente a questões de valorização da cultura nacional e respeito com seus clientes. Ao se apresentar no evento internacional, a marca, famosa por suas estampas vibrantes e seu discurso sobre a cultura brasileira, não só se coloca no centro da discussão sobre o design nacional, mas também em uma posição de alto risco, dado seu histórico de atitudes problemáticas. A Farm construiu uma imagem de marca que se vende como símbolo de leveza e exuberância tropical, mas por trás disso, esconde críticas pesadas, principalmente em relação à sua abordagem superficial de questões sociais e culturais.
A marca, em sua busca pela representação do Brasil, frequentemente se utiliza de elementos da cultura afro-brasileira, indígena e popular, mas de forma que muitos consideram distantes da realidade vivida por essas comunidades. O uso de ícones culturais sem o devido entendimento gera problemas. É importante abrir espaços para a representatividade no processo criativo, buscando uma produção mais respeitosa e um diálogo com seu público-alvo. Nas polêmicas em que a Farm esteve envolvida, houve a sensação de que a diversidade é apenas um acessório para agradar a um público mais amplo e obter mais lucro, sem se comprometer e entender de verdade as questões importantes para esse público.
A Farm, ao afirmar sua ligação com a cultura brasileira, precisa ir além da estética superficial, idealizada e homogênea do Brasil. É preciso abrir espaço para o protagonismo de narrativas marginalizadas para além de peças de marketing.